Deus Não Existe

Benito Mussolini

(Publicado em 1904; Lausana, Suíça)

Prefácio

Instado por certos camaradas, publico hoje o desenvolvimento da minha tese, “Deus Não Existe”, e refuto os principais argumentos do evangelizador Tagliatela.

A luta contra o absurdo religioso é mais do que uma necessidade hoje em dia. A religião tem revelado a sua alma na incessante fornalha do sol. Manter a ilusão seria covardia. Não importa quais sejam as adaptações da Igreja para as novas e inexoráveis necessidades dos tempos – ai ai ai, são pura lamentação! — são tentativas, geralmente vãs, para ressuscitar os papéis do “banco divino”, o qual já trilha o caminho do fracasso.

Confrontado com a disseminação do livre pensamento, o Papa Sarto (Pio X), temeroso dos destinos da sua dominação, proclamou:

“Fiéis, o Anticristo ganha vida!
O Anticristo é a razão humana que se rebela contra o dogma e um deus abatido”.

Dieu n’existe pas

Quando afirmamos que “Deus não existe”, pretendemos negar, com esta declaração, o Deus pessoal da teologia, o Deus cultuado de diversas maneiras e modos diversos pelos crentes em todo o mundo, aquele Deus que do nada criou o universo, do caos a matéria, aquele Deus dos atributos absurdos que é uma afronta a razão humana.

Com cada nova descoberta da química, da física, da biologia, das ciências antropológicas, da aplicação prática de princípios sólidos, o dogma colapsa. É uma parte daquele velho edifício da religião que desmorona e cai em ruínas. O progresso contínuo das ciências naturais que agora se estende da cidade para o campo, dispersa a escuridão da Idade Média, e multidões desertam das igrejas onde de geração em geração valeram-se da oração a Deus — aquele monstruoso produto da ignorância humana.

Examinemos a natureza de Deus. Forçamo-nos, assim, a raciocinar em um vácuo, o Deus das religiões sendo a sua própria imagem do seu vácuo mental, a prova da completa ausência de qualquer atividade no raciocínio.

Como é possível que a ideia de um criador seja reconciliada com a existência de órgãos atrofiados e raquíticos, com anomalias e monstruosidades, com a existência de dor, perpétua e universal, com os conflitos e as desigualdades entre seres humanos?

Epicuro, o filósofo que viveu em Roma no tempo da decadência da República, levantou os seguintes questionamentos:

“Ou Deus quer acabar com o mal neste mundo e não consegue ter sucesso; ou consegue acabar com ele mas não quer fazê-lo; ou não consegue e sequer quer fazê-lo; ou, finalmente, quer e é capaz de fazê-lo. Se quer mas não tem o poder, não é o todo-poderoso. Se tem o poder para acabar com o mal e não quer fazê-lo, não é infinitamente bom. Se, como afirmam os teístas, pode e quer, diga-me, então, por que o mal existe na terra, e por que Deus não o torna impossível?”

Aquilo que mais afronta a razão humana é o fato inconcebível do poder criador de um Deus que do nada criou o tudo, do caos o universo…

Uma pessoa teria de ser completamente desprovida de conhecimentos em fisiologia, botânica e psicologia para afirmar hoje a existência de uma “alma” independente do corpo; do contrário, um não forma um dos dois aspectos distintos que constituem a singular natureza humana.

O dogma é absurdo porque pressupõe o imobilismo e o absoluto. Nada no mundo é absoluto, tudo é relativo. Nada é completamente imutável, mas há uma contínua transformação, um perpétuo movimento de forças.

O dogma apresenta à razão humana um obstáculo ao progresso porque impõe limitações aos dolorosos mas salutares impulsos que guiam a busca pela verdade, porque restringe a livre expansão de toda energia intelectual.

A ciência está agora em vias de destruir o dogma religioso. O dogma da criação divina é reconhecido como absurdo.

“A religião é o ópio do povo”. — Karl Marx.

Estando demonstrado que o dogma religioso apresenta-se ao espírito humano e à racionalidade crítica como “a consagração absoluta do absurdo”, vejamos porque a religião moral é “imoral”.

Os evangelizadores são ridículos quando, em vez de estudarem a Bíblia como um documento de certo interesse histórico, tentam creditá-la a vida real e trazer para as massas os princípios de Cristo (que talvez jamais tenha existido) como os princípios éticos de uma moralidade eternamente jovem, permanente, moderna, em completo acordo os tempos atuais. A Bíblia e a chamada moral cristã são dois cadáveres que os evangelizadores usam na tentativa de impregnar a vida com, há de se concordar, um sucesso pequeno o suficiente.

Fica claro, assim, que a moralidade religiosa envolve algo de resignação e sacrifício, uma moralidade que talvez seja cara aos fracos, aos degenerados, aos escravos, mas que resulta na diminuição da razão e da personalidade humana. Ela guia o homem pela terra, fazendo-o dele um escravo da divindade; favorece a conservação daqueles sentimentos primitivos que pertencem àquele período da vida animal há muito deixado para trás, e transforma o “ser pensante” numa “ovelha passiva” que vive no medo do julgamento final.

A moralidade religiosa exibe nas suas origens os estigmas do autoritarismo precisamente porque pretende ser a revelação da autoridade divina. A fim de traduzir esse autoritarismo em ação e impô-lo sobre a humanidade, o clero dos reveladores tem florescido e com ele a mais atroz intolerância.

O certo é que a religião é uma doença psicológica do cérebro, uma contração, um esmagamento do indivíduo que, se for profundamente religioso, parece a nós anormal.

A história de muitos santos, beatificados pela igreja, é repugnante. Mostra nada mais do que uma profunda aberração do espírito humano em busca de quimeras extraterrestres; é um delírio que pode culminar no estado de espasmos de paixão e que termina em loucura.

Portanto, muitos dos que hoje pairam sobre os altares da Igreja Católica são casos patológicos, histeria, déomanes e demonomania.

Mesmo ainda hoje nas partes mais remotas da Itália e da Espanha podemos testemunhar fenômenos semelhantes: São Januário para a população de Nápoles e Madona de Lurdes para os fanáticos da França. Não são aberrações análogas?

Quando lemos sobre a história das religiões descobrimos que a religião se vale do lado patológico do cérebro humano. Se nos dias de hoje a Idade Média está confinada nas sombras densas dos conventos, deve-se ao triunfo do ceticismo; e se a doença epidêmica da religião não mais se manifesta com a terrível intensidade de outrora, deve-se a diminuição do poder político da Igreja que antigamente colocava nas cabeças das pessoas o seu capuz de liderança.

A religião se apresenta aos nossos olhos numa outra característica: a atrofia da razão. A faculdade que torna o homem diferente dos animais inferiores é o poder da sua racionalidade. Mas os crentes devotos renunciam a razão, se recusam a compreender as coisas que os rodeiam, os inúmeros fenômenos naturais, porque a fé religiosa que têm já é o bastante. O cérebro perde o hábito de pensar; e ébrio de religião lança a humanidade de volta ao animalismo.

Para concluir, dizemos que o “homem religioso” é uma anormalidade e que a “religião” é a causa determinante das doenças epidêmicas da mente as quais exigem os cuidados de psiquiatras.

A religião tem se mostrado, onde lhe abrem espaço, como a instituição cujo objetivo é o poder político com o qual  materializa a exploração e a ignorância das pessoas.


Tradução do original italiano para o inglês (base da nossa tradução) disponível no endereço:
https://ia600807.us.archive.org/34/items/GodDoesNotExist/GDNE.pdf


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